“Educar a mente sem educar o coração não é educação”
Aristóteles.

Em 1999, ou seja, há 14 anos atrás eu tive que fazer uma prova de inglês como parte do processo de seleção do mestrado em psicologia em uma universidade inglesa. Como de costume, teria uma redação sobre um tema que eu só saberia na hora do exame.

Antes da prova eu passei um período me preparando e fiz alguns simulados de redação. Todos com o mesmo padrão: uma pergunta polêmica para ser respondida e a resposta deveria ter um parágrafo de introdução, um segundo com argumentos a favor, outro com motivos contra e um parágrafo final. Tranquilo…

Chegado o grande dia a prova era no computador e a redação deveria ser feita em 30 minutos no máximo. Depois de várias etapas do teste realizadas e eu já cansada, abriu a tela do computador com o tema da redação e o cronômetro rodando…

Pergunta: “Se você tivesse que criar um produto qual produto você criaria?“.

O quê? Produto? Que produto? Como assim? Cadê a pergunta polêmica para eu responder com aqueles parágrafos que eu treinei???
Nossa… E agora?!!

Por uns dois minutos me deu branco total, me senti traída por aqueles simulados de redação e revoltada com a situação.

Respirei fundo, contei até dez e fui saindo daquele estado lastimável.
Consegui pensar em duas coisas:

1- se eu for por este caminho de criar um produto e entrar no ramo do marketing ou do design já era o meu mestrado…
2- então, vou falar sobre alguma coisa na minha área: Psicologia. Pelo menos o vocabulário fica mais fácil.

Foi aí que, como num passe de mágica, uma entidade criativa do além tomou conta da minha mente e me deu a seguinte idéia: vou criar um método de ensino que ajude as crianças a entender e a reconhecer as diferentes emoções.

Fui escrevendo a redação sem parar e quando terminei a última palavra… a tela do computador se fechou. Ufa!
Enfim, deu tudo certo, passei na prova e tive uma boa nota na redação.

Tempos depois, já no mestrado eu tinha alguns temas em mente para a minha dissertação. Mas, por uma dessas coincidências da vida, acabei sendo envolvida com um grupo de uma pesquisa já em andamento.

Adivinhem sobre qual assunto?  De que maneiras as crianças desenvolvem a capacidade de entender e reconhecer as emoções e qual o impacto disso no desenvolvimento infantil. Esse foi o tema da minha tese.

Curiosa a vida, né? E aquela redação de inglês sempre ficou na minha mente.

Recentemente, descobri um departamento super interessante dentro da renomada Universidade de Yale nos EUA: Center for Emotional Intelligence (Centro para Inteligência Emocional). Ele foi criado a partir de pesquisas que comprovam que a alfabetização emocional na infância protege a criança de vários distúrbios emocionais e desenvolve comportamentos essenciais para uma performance acadêmica positiva e para uma boa qualidade nos relacionamentos em geral.

O diretor do departamento Dr. Marc Brackett lidera um programa inovador chamado  RULER: Building Emotional Literate Schools (Construindo escolas emocionalmente alfabetizadas). Ele tem sido implementado em várias escolas na Inglaterra, EUA, Canadá e Austrália desde 2005.

Aí estava o “produto” que eu descrevi na minha redação de inglês há 14 anos atrás. Era exatamente isso!!!

RULER é a palavra formada pelas iniciais das cinco habilidades emocionais ensinadas no programa dentro das escolas:

ecognizing emotions in oneself and others (Reconhecendo emoções em si e nos outros)
nderstanding the causes and consequences of emotions (Entendendo as causas e consequências das emoções)
abeling the full range of emotions using a rich vocabulary (Nomeando uma gama de emoções usando rico vocabulário)
xpressing emotions appropriately in different contexts (Expressando adequadamente as emocões em diferentes contextos)
egulating emotions effectively to foster healthy relationships and achieve goals (Regulando efetivamente as emoções para criar e melhorar relacionamentos saudáveis e conquistar objetivos)

O RULER oferece vários formatos de serviços para atender escolas, educadores, famíilias, … Além disso, o Center for Emotional Intelligence tem um foco grande na prevenção de bullying nas escolas e na internet a partir do ensino do reconhecimento das diferentes emoções e do impacto delas no dia a dia das pessoas.

O RULER tem mostrado resultados muito positivos nesses 8 anos de existência: os alunos têm notas maiores no final do ano, desenvolvem melhores estratégias de estudo, maiores competências socioemocionais e mostram menos problemas de atenção e aprendizado. Além disso, a atmosfera dentro das salas de aula se torna mais positiva, melhorando o comportamento dos alunos. Isso é muita coisa!!

A revolução no sistema educacional precisa de programas como este. Entender os sentimentos e seus efeitos nas pessoas é a base para todas as relações humanas.

 

Imagem de leticiaalvares10 por Pixabay