(Esta reflexão é uma homenagem a Ju Amaral, irmã do ator Paulo Gustavo, e a todos os filhos que ficam depois da morte de um irmão ou irmã).

Quando perdemos nosso marido ou esposa ficamos viúvos. Órfãos, quando morrem nossos pais. Mas, que nome damos aos pais que perdem um filho? Não há. Assim como não existe uma palavra para definir a condição de uma pessoa que fica sem os seus irmãos.

Como descrever o sofrimento e o vazio deixados pela perda precoce de alguém amado que compartilha a vida com a gente desde pequeno?

Quando eu tinha 17 anos meu único irmão, quatro anos mais velho, morreu em uma batida de carro.

Eu fiquei.

Fiquei e vi a alma dos meus pais perder a vida. Vi a mente da minha avó perder a razão. Vi os olhos de vários amigos do meu irmão transbordarem de lágrimas. Me vi órfã de pais vivos e precocemente introduzida ao sofrimento humano em seu estado bruto.

Por muitas vezes, os filhos que ficam tornam-se invisíveis ao olhar da família e da sociedade. Não por mal, mas porque presume-se que a dor dos pais é sempre e necessariamente maior do que a dos irmãos.

Provavelmente sim, mas talvez não.

Eu fiquei. E desde então escolhi a vida.

Conheci a paixão adolescente. Senti o prazer das novas descobertas.Descobri a liberdade ao me lançar em aventuras no exterior. Fiz queridos amigos na faculdade. Experimentei o amor do casamento. Me desabrochei profissionalmente.

Hoje, mesmo depois de também perder meus pais, eu escolho ficar.

Fico com o indescritível amor pelo meu filho. Com o profundo amor e admiração pelo meu marido. Com a vontade de cuidar da minha casa e cultivar o meu ninho. Com o desejo de manter o afeto dos meus amigos. Com a força de criar.Com a capacidade de inovar a partir da dor. Com a crença de que continua valendo a pena ser honesta. Com a motivação de inspirar as pessoas. E, acima de tudo, com o impulso de continuar.

A todos os filhos que ficam, desejo que consigam escolher a vida.

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Crédito imagem: Photo by Rajendra C D on Unsplash